sexta-feira, dezembro 01, 2006

desperdídio

Meu ouvido esquerdo dói. É a maldita DTM. Ou talvez seja só culpa. Eu sinto-me culpada por tudo. Por tudo. Especialmente pelas coisas que eu não fiz, mas que pensei um dia em fazer.
Eu só queria ser uma mulher como as outras. Não dá pra ser como todas, claro, mas eu queria estar na média. Não queria ser fisicamente diferente. Nem muito menos emocionalmente. Não me sinto acima da média, ao contrário, ainda me sinto a última das mulheres. E ainda queria poder ouvir Maysa, mas tenho medo de ouvi-la... Desliguei o som de novo. Às vezes meus pensamentos me fazem tanto barulho na cabeça que não consigo ouvir música. E o ouvindo latejando insistentemente.

Me dei conta hoje, agora, agorinha mesmo, que o aniversário dele, do Certo Alguém, foi no domingo. Eu não lembrei no dia, mas eu nunca lembro mesmo o aniversário de ninguém no dia, nem mesmo o dele. Talvez tenha sido por isso que ele tenha me olhado com aquela cara de cachorro que caiu da mudança na segunda quando apareceu no trabalho depois de uma semana... talvez ele quisesse que alguém tivesse se lembrado, alguém como eu. Mas ninguém bateu parabéns e nem nada. Não vi ninguém dando abraços e dizendo “foi seu aniversário? Parabéns atrasado!”. Não, nada, nem uma palavra. Eu gostaria de ter podido dizer algo, se tivesse lembrado no dia, ou mesmo depois, agora. Mas não posso. Pra minha própria proteção, apaguei o número dele do meu celular e o endereço de e-mail também. Eu não tenho motivos pra ligar ou escrever pra ele, não somos amigos. Somo apenas colegas de trabalho. E, entre todos aqueles homens, ele é o que menos gosta de mim. Claro que é, se não, qual a graça? Se ele gostasse de mim, se desse em cima de mim, que graça teria gostar dele? Portanto, não ligarei e nem escreverei pra ele e nem darei parabéns atrasado. Só quero mesmo é que este ano termine logo pra eu poder ficar longe dele o tanto quanto possível. Tomara que eu durma muito nessas férias e esqueça como a vida é quando estou acordada. Tomara que eu possa ler muito e mergulhar na fantasia dos outros porque a realidade da minha vida é monotonia em tempo integral. Não, monotonia e frustração em tempo integral. Talvez ele seja o único que não tenha se deixado levar por falsas impressões e fantasias a meu respeito, e por isso ele seja o que menos gosta de mim lá. Sei que tem uns que gostariam de me comer, porque devem achar que sou algo de exótica, sem inibições sexuais e que vou fazer coisas que as esposas não fazem. Erro crasso. Não sou nenhuma dançarina exótica e estou anos-luz atrás de qualquer mulher mediana na minha faixa etária no que diz respeito a coisas sexuais. Falta-me a experiência que

Comprei perfume pra mim hoje. E fui ao cinema com minha melhor amiga. Melhor fazer hoje coisas boas do que esperar por um futuro que – ninguém garante – vai acontecer. Eu queria comprar um perfume específico, um que só sei como se pronuncia, mas não sei como se escreve: amarija. É doce, mas não muito. Estava falando sobre ele quando vi a lojinha de perfumes genéricos na minha frente. Acabei comprando uns frasquinhos de três outros perfumes, e não levei o tal amarija. Me identifiquei com um outro, fantasme. Ele é um perfume estranho, não sei explicar com que se parece, mas eu gostei. Talvez porque ele é realmente estranho. Até o nome dele é estranho. E, assim, com um gosto pra coisas estranhas, como é que eu poderia ser uma mulher como as outras, na média? Com tornozelos normais acompanhados de pés normais, tamanho 36 pra ser exata? Como, meus senhores? Como?
Pouco me interessa que algumas pessoas não tenham pés, ou braços, ou não se movam da cintura pra baixo. Saber que existem pessoas em situação pior do que a minha não em faz sentir aliviada. Não mesmo. Me faz ter raiva da idéia de que existe um deus. Deus sádico-filho-da-puta! Faz uns sofrerem pra caralho pra que outros se sintam felizes por terem problemas menos grandes, ou por serem medíocres e darem graças a deus por serem medíocres. Ninguém deveria se sentir mal, se sentir inferior, se sentir apartado, diferente. Ninguém.

Nas lojas, nada nunca me cái bem. Impressionante como meu humor cai por conta disso. Eu estava olhando umas roupas hoje numa loja e estava tocando uma música bacana, desses hip hops de festa e eu estava com vontade de dançar mas aí entrei no bendito provador e foi aquela tristeza porque nada me servia. É como se eu tivesse que usar roupas que simplesmente não são fabricadas! O tamanho 38 fica largo, o 36 fica apertado, o M não caí bem, nem muito menos o P ou o G. Será que eu sou uma espécie de Frankenstein que tem que ter roupas com cumprimento 40 e largura 38? Nossa, na hora já dei aquela brochada e toda a vontade de dançar ou de fazer qualquer outra coisa foi por água abaixo... Sapatos então, putz, melhor nem olhar muito porque todos os modelos bonitinhos param no 36. Quando tem um 38 pode ter certeza de que a cor é algo como branco ou bege que eu detessssssssssto. Eu preciso mesmo aprender a costurar porque senão não vou nem ter como me vestir de um jeito diferente da combinação calças folgadíssimas e camisetas.
Sim, meus senhores, eu comprei uma roupinha no sábado e comprei melissinhas também. Mas aquilo foi uma exceção tão grande! Por isso comprei duas melissinhas e não uma, porque quando aparece alguma coisa no meu tamanho e que me agrada, preciso comprar porque sabe-se lá quando é que encontrarei algo bacana pra mim e em mim de novo!
Eu queria ser uma menina. Não precisava nem ser um mulherão nem nada. Só uma mulher normal. Na média. Alguém que experimentasse as roupas e elas ficassem boas. Acho que isso é pedir demais mesmo. Nunca serei normal em nada. Talvez só no meu desempenho acadêmico. Aí eu sou bem na média. Pelo menos não estou abaixo da média lá... Acima também não estou, não sou nem um pouco versátil ou articulada. Nem minha memória é boa. Nunca serei uma acadêmica também, não tenho nada de novo pra dizer sobre nada. Nem muito menos alguma coisa de útil, algo que fosse uma coisa boa pras outras pessoas. Não não. Eu estou na média. Me formarei, e começarei a estudar pra concursos. Devo tentar muitos e muitos e muitos até desistir porque nunca tive notas boas, nada além da média. Talvez um dia eu passe em algum mas com aquela classificação láaaa pelas últimas. Ou seja, eu sou um desperdício de matéria-prima, de mitocôndrias. Um desperdício de proteína. Um desperdício de carne e osso... O desperdício em carne e osso.

Alguém pode me dizer o que diabos estou fazendo aqui neste planeta?

Deixem pra lá, meus senhores porque este é o tipo de pergunta que nunca tem uma resposta muito animadora e eu não preciso de sal nas minhas feridas por hora...