quarta-feira, junho 01, 2005

31/05/05

o que eu queria é que ele sentisse a minha ausência finamente bordada em cada um dos gestos dela, translúcida como a luz que o iluminava enquanto caminhávamos em sentidos opostos, paralelamente
foi como se não nos conhecéssemos
só havíamos os dois ali, caminhando na mesma direção, sentidos opostos, mas nunca nos encontramos, sequer olhamos um para o outro no momento exato em que passamos um pelo outro
foi como se não nos conhecéssemos
foi como rodar rápida demais e ser lançada na tontura dessa tarde
foi como perder o jogo
e é tão difícil admitir que perdi o jogo
a hora
a vez
o chão
a vergonha...
eu perdi
eu segurei o quanto pude, sabe? me agarrei a ele o quanto pude, mas ele partiu
e, no entanto, onde mais ele poderia estar além de aqui, bem aqui, dentro das minhas idéias homicidas?
ele nunca esteve senão nas minhas idéias...
um girassol tão dourado no coração do cerrado seco que sou eu

eu sou árvore retorcida, casca grossa e seca, quase sem folhas, empunhando galhos reais e imaginários contra o azul indolente de maio no Planalto
mas eu vivo, podes crer
ali, embaixo da cinza escura casca deformada, há vida pulsando louca e metodicamente em cada célula
eu sou aquela árvore ali
sozinha lutando contra o mundo
e pelo mundo

queria desdobrar-me de mim mesma em muitas outras, cada uma com apenas um fragmento de Dor
cada uma das minhas partes se dividiria em muitas outras com fragmentos ainda menores de Dor e assim sucessivamente até que a Dor desaparecesse
então minhas partes se reagrupariam até que eu estivesse completa novamente
sem Dor sem Dor