sábado, janeiro 28, 2006

vinte e sete de janeiro

meu pai está piorando, disse-me minha irmã. recusa-se a falar com qualquer pessoa e não quer comer mais quase nada.
penso nele e a imagem de minha avó materna definhando naquela cama me vem involuntariamente.
lembro da última vez em que o vi, seu olhar perdido de menino, de criança boba. os olhinhos azuis sem conteúdo, aquele cabelo branco totalmente fora do contexto daquele rosto, daquele sorriso bobo. sinto pena e uma ternura que jamais senti antes por ele.
lembro de uma foto em que estou sentada no colo dele brincando com qualquer coisa. eu tinha uns dois anos e não sabia de nada. nunca mais serei feliz assim.
tenho medo de que meu pai morra.
ele foi realmente um péssimo pai, mas eu sinto carinho por ele, não posso negar. como sempre, eu sou o vira-latas que os outros chutam e ele fica acuado, nunca avança, só gani e espera um gesto de compaixão de alguém. alguém, qualquer pessoa.
não quero que ele morra assim, tão arrasado, tão depedende daqueles a quem sempre negligenciou, vivendo da nossa pena, da pena de seus filhos que ele nunca amou ou respeitou. acho que isso deve ser a pior coisa que já aconteceu a ele.
e se agora eu choro é porque tenho medo de ver cair um homem que já foi muito forte e que uma vida bruta transformou no que ele é hoje. tenho pena do meu pai.
tenho pena de mim porque não consegui nunca ser sua filhinha querida. e só eu sei como me fez falta ser a filha querida de alguém...
e agora ele está lá, abatido, como um animal acuado, tendo que enfrentar seus demônios, tendo o peso da vida mal-vivida nas costas.

não queria que meu pai morresse assim.

e a quem alguém como eu poderia rezar na esperança de ser ouvida?
a que deuses eu pediria pela vida do meu pai?

terça-feira, janeiro 24, 2006

acontece...

É, é assim mesmo, de uma hora pra outra aquilo simplesmente não existe mais, não está mais ali. Eu achava que isso seria impossível, que as coisas não deixam de existir do dia pra noite, que não poderia sumir assim tão repentinamente, mas acontece. Agora eu sei que isso acontece.
Como se um móvel grande fosse roubado na calada da noite: a gente acorda e tem apenas o espaço vazio naquele lugar onde costumava haver algo. Só um espaço vazio.
Eu conhecia o processo inverso, que é como se a gente se desse conta da existência de uma árvore enorme que não existia antes. Depois de um minuto a gente pensa que, na verdade, a gente é que, incrivelmente, nunca tinha reparado nela, embora fizesse aquele percurso diariamente.
Nossa percepção das coisas que nos rodeiam diz muito sobre a maneira como lidamos com o mundo, não só os objetos, mas especialmente com as pessoas... Eu sei que tenho o hábito de ver coisas onde elas não existem...
Agora preciso rearranjar tudo pra que o espaço vazio seja preenchido por outras coisas. Este processo requer paciência, tempo e determinação porque fazer mudanças é difícil, elas consomem muita energia. Mas é necessário. É preciso. Eu preciso muito mudar.




http://www.leoslyrics.com/listlyrics.php;jsessionid=1C95D0D64A8E1C0738152CBF946C4095?hid=fVDeJOZtjOk%3D

http://brazilianmusic.com/cartola/poesia.html

domingo, janeiro 22, 2006

meu pai

Ontem fui visitar meu pai na casa do meu irmão mais velho.
Fiquei tão triste ao vê-lo deitado naquela cama, o ar alienado... Ele me pareceu mais velho do que nunca.
O lado esquerdo está praticamente todo paralisado, e ele só às vezes consegue abrir e fechar a mão esquerda. O lado direito está bom, mas não dá conta do corpo todo, então ele não se levanta sozinho, e come com muita dificuldade.
Eu fiquei lá ao lado de sua cama, depois ao lado de sua cadeira na varanda, dei-lhe água, suco, bolo, caldo, maçã, cortei e lixei suas unhas, ajeitei o travesseiro, a almofada, o banquinho, a bandeija... Fiquei com ele a tarde inteira e até à noite quando minhas irmãs chegaram.
Conversamos pouco, comentários sobre o que passava na tv. Eu estava bordando e, de repente, me deu uma sensação de que eu estava bem, eu estava viva. Totalmente egoísta isso, mas foi o que senti. Não me senti mal em nenhum momento por estar fazendo as coisas pra ele como eu imaginava que me sentiria. Não senti pena dele, ele fez por merecer. Mas eu senti pena do esforço dos meus irmãos, muito maior que o meu: minhas irmãs e meus irmãos deixam suas casas e suas obrigações com suas famílias e vão lá, fazem comida, dão banho nele, trocam a fralda (isso sim é que é deprê...), lavam suas roupas, seus lençóis, estão gastando com remédios, comidas, as benditas fraldas que são caríssimas.
Eu só fiquei algumas horas.
Final de semana que vem eu volto lá.
Acho uma pena não ter nada o que conversar com ele que é meu pai mas nunca soube nada sobre mim e eu nunca soube nada sobre ele. Vivemos em tempos muito diferentes, ele é quase octagenário, nordestino, acostumado com a rudeza, acostumado com feijão, farinha e rapadura... A vida dele foi dura e ele foi negligente com seus dez filhos. Negligente de maneira cruel às vezes. E agora depende de nós, seus filhos. A vida é bem estranha.
Mas eu confesso que depois de ter visto minha avó vegetando, meu tio com Mal de Alzheimer, e meu pai assim, eu quero é aproveitar enquanto estou viva e lúcida, embora tudo seja uma bosta, embora minha baixa auto-estima me afunde em lamúrias e auto-comiseração, embora tudo pareça irremediavelmente perdido, eu quero estar viva, eu quero andar, eu quero sair por aí, quero dançar, comer, beber, ler, escrever, só ou com minhas amigas e amigos, porque isso tudo pode acabar sem mais nem menos...
Eu não quero morrer, mais do que isso: eu não quero ficar inválida.
Não quero meus irmãos se desgastando fisicamente, financeiramente ou emocionalmente por minha causa.
Não quero ficar doente assim nunca!
E fico feliz por estar podendo andar com minhas próprias pernas e cometer meus próprios enganos e tentar ficar bem por minha conta e risco.

sexta-feira, janeiro 20, 2006

vinte de janeiro

bem, pra continuar o rol de coisas tristes que têm acontecido, acabei de descobrir uma coisa que me deixou mais triste: um cara por quem fui apaixonadíssima há anos atrás me disse que era apaixonado por mim também, mas como eu não correspondi, isso acabou e ficou a amizade... eu não correspondi... na verdade eu jurava que ele só me via como amiga, então eu não queria estragar as coisas e fiquei sendo amiga, já que era a melhor das opções que eu achei que teria...
hoje em dia realmente não em mais nada a ver, nossas vidas tomaram rumos diferentes, ele já se apaixonou por outras minas e eu por outros caras, mas a sensação não deixa de ser triste, não deixo de sentir isso como uma perda e como uma espécie de traição comigo mesma.
como de costume, sou uma cega.
sabe o que é pior? não é a primeira vez que isso acontece e talvez nem seja a última. que merda.
tão triste deixar de viver uma coisa tão boa por achar que a rejeição é tão óbvia que nem vale a pena... maldita falta de auto-estima...
eu não faço nada certo nunca, não é? ah, meus senhores, meu caso é patológico. meu caso é perdido.
realmente o amor não é pra mim. meu timing é uma bosta. e se isso não fosse o bastante, minha paranóia delirante (ciúme+insegurança+manias diverersificadas+etc.) não me deixa abraçar uma paixão. é isso aí, meus senhores, tem gente que nasceu pra amar e ser feliz nisso e tem eu... afff...
com tudo o que tem me acontecido, isso me deixa ainda mais melancólica, especialmente porque é passado; mesmo que eu não estivesse tentando me recuperar da última perda e estivesse livre leve e solta, o cara é meu amigo hoje e não dá pra querer reviver um sentimento que os anos transformaram noutra coisa beeem diferente.

parafraseando o Bandeira, essa é a estrela que vai dar um brilho mais triste ao fim do meu triste dia...

agora pouco...

Duas doses de xiboquinha, por favor.
Por quê? Bem, eu não quero pensar muito hoje a noite.
Eu quero dançar. Dançar.
E dancei bastante, flutuando na embriaguez.
Prefiro ficar de olhos fechados, bem fechados. Assim é como se eu estivesse – a despeito das eventuais cotoveladas e empurrões – sozinha na pista de dança. Eu danço de olhos fechados.
Eu sorrio de tudo guiada pela mão do álcool. Mesmo sem ver graça nenhuma eu sorrio. Fico dançando com aqueles dentes escancarados, aquela bocarra absurda...
Quando abro os olhos, bem, aí eu sou natural como uma samambaia de plástico... é, eu sinto como se as pessoas dissessem que eu sou uma planta artificial perdida ali.
Agora é a fatia de pizza fria.
Agora é a sonolência do álcool.
Agora é a vontade de ter ficado lá dançando, esquecida de tudo, da vida, de tudo.

Tive um momento de estranhamento tão intenso que me deixou as pernas sem saber o que fazer... Como pode alguém parecer tão outro assim tão de repente?!
Ele simplesmente já não é mais meu. Não é...
E eu sou isso daqui mesmo, sem nem ter mais. Esse lapso no tempo e no espaço, essa carcaça, essas olheiras, esse medo do escuro. E a musiqueta do Caetano pulsando nos meus ouvidos moucos... "quase fui feliz um dia, não tinha nem fundamento..."

quinta-feira, janeiro 19, 2006

acabou...

acabou
acabamos
nada mais de meu
ele não é mais meu
eu não sou mais dele
e tão rápido quanto a queda de uma lágrima, acabou
acabou
nada de reticências
nada de nada
o amor continua latejando nesta carcaça
minha cabeça dói
mas a maldita da consciência está limpa, leve
odeio fazer “a coisa certa”
queria ser inocente como uma criança e ignorar o que é certo e o que é errado
queria viver simplesmente
mas eu não sei ser feliz
não, eu não sei ser feliz
eu não sei ser simples
eu não sei de porra nenhuma

quarta-feira, janeiro 18, 2006

anotações no meu caderninho

Bem, nestes últimos meses estive sem computador. Não faz mal, também não tinha muito o que escrever. Final de ano em escola é uma merda e eu quase tive um troço pra entregar os malditos diários a tempo, ou melhor, menos atrasada do que de costume.
E aqui estou eu, triste como sempre, escrevendo, meus senhores, o de sempre: desfiando o rosário das minhas misérias, interpretando esta tragicomédia que parece não ter fim...

Então aí seguem as coisinhas que andei ruminando e anotando no meu caderninho ultimamente:

10/12/05

Ando montada no meu próprio bolso
e se meus fundos são curtos, não vou muito longe não
que também são curtos os meus passos
medos, esses são grandes
mas por dentro, ah...
vi tantos mundos, corri tanta estrada, tantos caminhos... já fiz e desfiz universos.
E se os fundos e os medos me deixam estática, meu coração me dá voltas, abre minhas portas, solta minhas pernas pra outros mundos, bem outros.


20/12/05

Bebi um pouco. Álcool, assim na medida certa, é ótimo. Nem demais, pra eu não passar mal, nem de menos, pra meu humor se fortalecer. Agora estou lendo “A Assustadora História do Sexo”. É divertido.
“... a maneira mais segura de tornar as pessoas menos pecadoras é reduzir o número de pecados.” Richard Gordon


12/01/06

No Piauí.
Está escurecendo. O sol poente à esquerda. A lua cheia, brilhante, à direita. Isso sempre me faz lembrar “o feitiço de Áquila”.
Preciso me lembrar de nunca mais viajar de carro...

No quarto ao lado, minha avó materna está morrendo. Pessoas ficarão a noite inteira indo e vindo, checando se já se foi ou se “vive” ainda.


Meu irmão disse à pouco que minha mãe ligou para avisar que meu pai teve um derrame e está hospitalizado, as pernas inertes. Não, as duas pernas não, o lado esquerdo do corpo. Excesso de álcool num organismo velho e amargurado. Tenho pena dele. Sobretudo, a despeito de toda mágoa, tenho pena dele.
E eu pensei que seria uma viagem pra relaxar...


13/01/06

sexta-feira treze

Ainda bem que as coisas no dia de ontem não aconteceram hoje.
Minha avó dorme no quarto ao lado. Como sabem se ela dorme ou se morreu? Não tenho coragem de ir ver eu mesma. Prefiro o benefício da dúvida.

Tomei outro banho e agora vou dormir um pouco. Talvez eu leia um pouco até dormir.


17/01/06

“águas de março” Essa música seria uma trilha sonora bem lírica pra esses quilômetros de sol e poeira de agora...

árvores grandes
árvores pequenas
tentamos desviar dos animais mortos apodrecendo
calor dos infernos!
nuvens de poeira
campos de soja
paisagens lindíssimas, numa melancolia e abandono que dá gosto de se ver
estradas de chão batido, esburacado e desnivelado se estendendo por quilômetros e quilômetros
cidades minúsculas paradas no tempo
tantas nuvens!
tantas nuvens...
crianças vendendo frutas sem o menor viço e esmolando
quero ir pra casa
a beleza desses espaços abertos me deixa embriagada, tonta, pelo avesso
e esse sol!
esse sol não perdoa nada
não posso com esse sol
não posso com nada disso
quero ir pra casa e ficar lá, cercada de paredes, de concreto,
vendo o verde em doses homeopáticas na segurança do meu lar
Será que minhas plantas estão bem?