domingo, maio 28, 2006

paliativos

Meus ouvidos zunem alto. Estou ouvindo mal por conta do som alto demais ontem. Fui a uma festa. Precisava sair, dançar muito, me exorcizar. Tem gente que prefere igreja, eu acho melhor ir à festas, mas como tudo na vida, sempre há um preço a se pagar. Ficamos muito próximas das caixas de som, por isso o zunido hoje. Foi bom ter saído, ter dançado muito, bebido um pouco, tentado rir das músicas que direcionavam mais ainda os meus pensamentos pra onde eles deveriam justamente se afastar... paliativos... paliativos... Não há cura, só paliativos. Mas dançar é bom, e eu quase consegui não pensar Num Certo Alguém durante um bom tempo, até tocar a música que caiu como uma bigorna na minha cabeça: what difference does it make?

“… now you know the truth about me
You won't see me anymore
Well, I'm still fond of you
But no more apologies
No more, no more apologies

I'm too tired, I'm so sick and tired
And I'm feeling very sick and ill today
But I'm still fond of you…”

Aí o resto da noite foi realmente no piloto automático porque eu só conseguia ouvir essa música dentro da minha cabeçona de mamão. Não me conformarei nunca com o fato de não pararmos de gostar imediatamente de quem nos dá um fora. Acho um absurdo isso! Deveria ser uma coisa de, no máximo, três dias. Aí, como se fôssemos personagens míticos, ressuscitaríamos da nossa própria dor no terceiro dia, abriríamos novas asas e voaríamos pra longe, bem longe daquela carcaça velha e dolorida, como as borboletas que saem dos casulos. Sempre fui lagarta, ainda não conheci o que é ser borboleta. E elas me fascinam. Adoro-as. Invejo-as.

E, mais que nunca, temo a segunda-feira, acordar cedo, ir trabalhar... ai, deuses, ir trabalhar será mais difícil que nunca... E sei que ninguém poderá compartilhar da minha dor, devo permanecer exatamente igual a todos os outros dias. Posso estar morrendo por dentro, mas ninguém poderá ler nada no meu rosto. Ao contrário, devo agir com indiferença, e ficar o mais calada possível e isso, ah, meus senhores, isso pra mim é tarefa homérica porque eu sempre falo demais quando fico nervosa, ou seja, nos momentos em que o silêncio mais me seria útil. Devo calar. Calar. Silenciar. Não olhar pra os lados. Devo preencher diários, concentrar-me na realização de tarefas não muito difíceis, e permanecer calada. Vou ficar mentalizando isso o dia todo, a noite toda até dormir, e amanhã vou acordar mentalizando isso, repetindo pra mim mesma, escrever à caneta nas costas da mão, e eu não vou dizer quase nada amanhã, eu vou conseguir passar desapercebida daqui pra frente, vou conservar meu sofrimento em mim e não vou demonstrar pra ninguém porque ninguém lá tem nada a ver com isso.
Já fui muito melhor nisso, na arte de não deixar transparecer absolutamente nada do que se passava em mim. Eu já fui ostra.
Trabalho não é ambiente pra se misturar esse tipo de sentimento. Não mesmo. E esse sentimento vai ter que morrer sufocado. Será asfixiado. E com ele, como de costume, uma parte boa de mim porque, como tudo na vida, sempre há um preço a se pagar. Sempre há um preço. E eu acredito muito que toda vez que temos que sufocar algo bom, algo puro, não é impunemente, não pode ser sem perdermos algo em nós mesmos. Triste isso, não, meus senhores? Mas a vida continua, and I’m still fond of him...