quinta-feira, setembro 29, 2005

vinte e nove de setembro

vou decorar as paredes do seu corpo com o suor do meu sono inquieto
forrar da saliva dos meus beijos guardados seus lábios e suas pálpebras
serei sua
serenamente
serei sua selvagem
você é o meu sorriso
e eu vivo
pulso
não corro
olho prao céu nublado
será que vai chuver você em mim?
então espero a resposta
espero descontrolada
risco os muros
quebro vidraças
vandalizo meu corpo inerte
espero
talvez caia a tepestade ou pode até nevar
chuva de granizo
chuva de meteoros
chuva de canivetes
e você sorri de algum lugar
dentro do meu ponto cego

sexta-feira, setembro 23, 2005

testemunho

Eu entrei hoje mais cedo no orkut decidida a escrever um testemunho pra o Meu Lindo, mas desisti quando vi que uma fulana havia escrito um testemunho pra ele. Mas é claro que fiquei puta de raiva! Meu sangue nordestino ferveu na hora e eu senti vontade de quebrar objetos gritando "me solta que eu vou furar essa quenga!", mas, enfim, não tinha ninguém me segurando, e nem sei quem diabos é a mina, se ela é ou não uma piriguete das quebradas. Ciúme é uma coisa danada pra crescer sem a gente nem se dar conta...

Mas mesmo tendo me acalmado um pouco mais, perdi a vontade de colocar o testemunho ali...


Luis... Luis...
Luis é onde eu queria estar agora...
Luis e seu sorriso d’eu me perder...
meu homem
boboca e cabeça-de-mamão mais lindo do mundo!
o cara que me deixa sem palavras, sem ar, sem jeito, sem rumo... e me faz feliz!!!
me deixou perdidinha
ele me viu me encontrou
e desde então é o Luis que me ensina a ter medo e prosseguir assim mesmo
eu sonho acordada com ele e adormeço no abraço dele
Luis é sonho de verdade
é o cheiro de terra molhada de chuva
a sensibilidade aguçada
o senso de humor
a virilidade graciosa e pueril dos Homens
Luis é outra coisa
Luis é muito!
seu sorriso raro
precioso
meu canteiro meu Lindo meu menino meu homem meu sorvete de pistache coberto com licor de menta
Luis é o cara que estava guardadinho pra mim, me esperando em alguma galáxia longínqua há algumas carteiras de distância
e agora eu só quero que a gente continue assim, juntos
ah, Luis, meu Luis... você é uma das poucas pessoas extraordinárias e eu só queria mesmo que você soubesse o quanto é importante na minha vida e como eu gosto de você e espero que o amanhã realmente seja mais do que uma abstração... você me faz querer o amanhã!

terça-feira, setembro 20, 2005

chega de saudade

Não gosto de sentir saudade
Não quero sentir
O problema da falta é que estou acostumada com ela
Meu corpo está acostumado a querer e não ter
Meu espírito está acostumado a sofrer
O surpreendente, a novidade, é ser feliz, estar bem
A Dor, essa eu conheço desde desde
Conheço e não gosto dela
Por que eu, na posse das minhas faculdades mentais, preferiria sofrer, escolheria sofrer, tendo a possibilidade concreta e palpável de ficar tranqüila, bem, feliz e contente???
Ele brinca de me machucar
Está me despetalando aos poucos
Depois talvez não me reconheça
Eu, nua de minhas pétalas, nua de mim, quem seria?
A distância só me estimula ao esquecimento e ao desprendimento, nada mais
O amor que eu sinto pelo meu irmão ou pelos meus amigos no exterior, há quem há tempos não vejo, não muda. O amor fraterno não muda com esses contratempos.
Achei que era chegada a hora de deixar desabrochar o Amor que tenho dentro de mim. Como sempre, estou enganada. Não quero sofrer por escolha própria, nem fechar os olhos pra achar que serei pega de surpresa quando escuto os passos da Tristeza em alto e bom som se aproximando de mim. Quero imaginar que posso amar livremente alguém que quer ser amado por inteiro, com toda a intensidade.
Quero mergulhar de roupa e tudo no mar, não numa miragem no deserto.
Não quero ter que recear, embora eu saiba que ninguém nunca poderá me dar garantias burocráticas de sentimentos porque sentimentos não são materialmente quantificáveis.
Mas como é que eu vou pular tendo a dúvida hedionda de que talvez serei cuspida de volta sem a menor cerimônia?
Meus senhores, o caso é simples: eu quero comprometimento. Quero alguém que eu sinta que posso contar porque eu preciso sentir que tenho algumas certezas. Não quero ter que sentir saudade maior do que a que eu já sinto, forjando situações. Não quero forjar nada. Quero poder deixar fluir enquanto está acontecendo algo porque se eu criar represas agora, talvez a água não saiba mais ser rio quando se soltar.
Achei que meu grande desafio fosse conseguir ter um relacionamento com alguém que eu realmente gosto e que acho que vale a pena. Achei que esse era o grande desafio... construir algo, construir tudo. Mas o Belo e o Bom parecem sempre me escapar por entre os dedos...
Talvez eu realmente tenha sido escolhida pra ser mais uma criaturinha ordinária, sem nada de realmente maravilhoso na vida... sou só mais um número nas estatísticas... Eu sou um inseto o frio nos pés a barriga roncando a lágrima engolida à força um gemido que ninguém escuta a queimadura de cigarro o leite azedo e o pão seco e duro Eu sou a farsa a faca cega cortando tendões a noite sem lua o cheiro dos velhos o vento o medo o não.

O problema, meus senhores, é que a Dor eu já conheço e com Ela já estou acostumada...

segunda-feira, setembro 19, 2005

insecto

Achei que eu faria dele meu abrigo...
E eu estava disposta a lhe dar o que penso ser o maior tesouro que qualquer pessoa possui: sinceridade.
No entanto, aqui estou novamente, no velho conhecido lugar quente e abafado, onde a dúvida me afoga como maré que sobe sem piedade desta carne vacilante. Aqui estou, entregue ao calor do choro contido.
Tive sonhos entrecortados. Nada se pode fazer numa tarde tão estupidamente quente. Ainda está quente. Quente demais.
Penso nele e o suor escorre testa abaixo, molha minhas axilas, entorpece minha vontade, anestesia minha confiança.
Pinto a unha de vermelho, um vermelho aberto, gritante, escandaloso. Enquanto isso, eu sufoco.
Como se esconder de um perigo que nos habita? Onde poderia eu, criança tola e indefesa, me esconder de Mim?
Será que Ele pensa em mim? Será que sente meu desespero, minha agonia lenta e viscosa que me percorre e marca? Será que a noite caindo é sua asa cortando o céu? Será que partiu de vez ou ainda respira sob o mesmo céu que eu?
Por que tanta gente anda de moto nesta merda de cidade? Por que não dão sossego aos meus ouvidos?
Por que as flores gritam Seu nome em suas cores vibrantes, tão vibrantes?
Por que o cantor no rádio grita Seu nome?
Quero me concentrar em outras coisas, quero trabalhar, quero ler, quero sair e andar pela noite quente como se houvesse um sentido e um propósito nessa merda toda, mas o medo me congela. Não faço nada.
Sou como este inseto que se lança à lâmpada... sou um inseto...

domingo, setembro 11, 2005



Uma vez um cara me disse que eu nunca estava satisfeita com nada. Foi a coisa mais acertada que ele disse a meu respeito. Sim, eu nunca estou satisfeita com nada porque eu quero muito, eu quero tudo. E, na época em que ele me disse isso, eu queria o mar e ele me ofereceu uma piscina...
Bem, quem dentre vós, meus senhores, se satisfaria com uma piscina, ainda que olímpica, quando vosso desejo apontava o litoral, o mar, o céu e o horizonte se fundindo em azuis? Lago Paranoá é o caralho!!! Eu quero o mar! O mar!


Agora estou me aproximando de um mar âmbar... E olho pra ele, fixamente, pensando apenas no momento de me atirar, de me lançar, de mergulhar de roupa, sapato e tudo. Foda-se quem estiver perto olhando e achando graça porque eu estive esperando há tanto tempo por isso, como alguém que vê o mar pela primeira vez mas já quase morreu afogada tantas vezes...


O possível..
Ele é possível. Apesar de ser claro pra mim que tudo é sempre um risco, que eu posso me perder de novo, que a Vida é sempre muito maior e mais complexa do que o meu entendimento limitado jamais poderá alcançar, quer saber?, eu quero mais é viver simplesmente. Sim, estou mais calma, mais tranqüila, porque quando me desespero, acabo fazendo grandes merdas e me machucando e machucando quem está perto e isso é tão ruim... Não, eu quero viver simplesmente. Quero viver. Chega de sobreviver, chega de vegetar. Chega de tatear na escuridão com medo de dar passos largos. O abismo, se ele existe e está logo à minha frente, se for pra cair, cairei de qualquer forma, a passos largos ou a passinhos hesitantes, porque desde que um pés encontre o vazio, pra o outro não haverá meio de segurar-se.
Mas o abismo não está ali, está aqui, bem aqui dentro de mim. E sei que posso puxar pra dentro quem eu mais quero bem. E isso dá medo. Mas não posso pensar nisso porque tudo, na verdade, é uma possibilidade. Mas como deixar de viver com medo de que esta ou aquela possibilidade se concretizem? Eu quero viver. Eu quero viver tendo Ele ao meu lado. Ele, o Menino Possível dos olhos inacreditáveis. Ele não é só um fruto das minhas idéias delirantes, Ele é. Nada de por-vir, nada de talvez. Ele é.
We were both raised in the House of Pain.
A gente se conhece. A gente se entende mesmo quando não se entende. E acho que Ele nunca poderá me quebrar como me quebraram, porque Ele me diz Suas coisas.
Ele é o Verbo e Ele é a Ação e Ele é o Sentimento.
E se Ele é instável, eu também sou. Não conheço calmarias. Mas queria conhecer com Ele.
E se Ele se deixa conhecer por mim, isso é o meu pára-quedas.
Se eu O conhecer, não haverá queda.
Por isso estou mais calma, por isso estou mais tranqüila.
Mas ainda temo e tremo diante da Vida. Ainda sinto indistintas coisas quando Ele me abraça. Porque ele é a urna em que deposito o que tenho pra ser salvo de mim mesma. Protect me from what I want…
Ele é O Possível. Ele está aqui, me impregnando do que é Belo e Bom. E eu quero que Ele permaneça quando tudo o mais tiver desaparecido. Agora, Ele é o que há de mais real. Agora, neste exato momento, neste preciso momento, eu quero estar com Ele.
Eu preciso Dele.
O que eu quero? Ele. Quero que Ele me leve a ver o que eu nem sabia que existia fora e dentro de mim.

O Amor tem data de fabricação e validade, meus senhores?

Pra quem esperou como esperei, desejou como desejei, nada está indo rápido demais porque só posso usar o meus parâmetros pra medir, não os dos outros. O inferno são os outros. Os outros e suas medidas, seus cálculos, suas idéias do certo, errado, conveniente, aceitável. Os outros que se fodam com todas as suas receitas de bolo pra felicidade. Eu quero descobrir minha própria Vida vivendo, que se fodam as receitas de sucesso, as revistas femininas, os programas de debate sobre moda, comportamento e saúde. Que quero é fazer minhas coisas, quero ser alguém mais verdadeira, menos comprometida com todo esse lixo e falsidade que anestesiaram o mundo. Não quero fazer parte deste mundinho. Quero ser outra coisa, estar em outro lugar, construir tudo novo, nem que seja só na minha cabeça porque, afinal de contas, onde mais as coisas existem?
Ele segura a minha mão. Meus senhores, vocês sabem o que é isso? Alguém, dentre vós, tem a menor noção do que é ter a mão segurada por Ele? Alguém dentre vós, já viveu isso? Já soube o que era ouvir a voz Dele, aquela voz linda linda linda linda sussurrada? Quem, meus senhores, quem saberia o que é sentir com essa intensidade a resposta – a Luz – depois de tantas preces ditas aos deuses que sempre me viraram as costas e se divertiram das minhas tolices e sofrimentos de mera mortal? E quem saberia o que é poder tocá-lo depois de um dia de espera? Ele conversa comigo e diz Suas coisas... alguém aí sabe o que é isso?! Acho que não... Mas eu sei! Eu sei! Eu sei!

E se chegar o dia em que a gente não se dê mais as mãos? Bem, isso é uma possibilidade. Mas, entre tantas possibilidades, porque eu tenho que me preocupar com a pior? Se Ele é o que há de melhor, porque me preocupar com algo menor do que isso?! Ele é O Possível Belo e Bom. E desde que Ele esteja assim, me dizendo bom dia, mergulho de roupa e tudo...

quinta-feira, setembro 08, 2005

oito de setembro e a carne das violetas

a textura da língua
a complexidade da língua
a limitação da língua
nosso idioma
nossa carne
momentos em que faltam palavras
instantes em que não há como escolher entre tantas, entre todas as palavras certas
a carícia das palavras sussurradas
a vertigem do que não é dito
nossos corpos que se calam
a sua língua na minha boca
o seu nome na minha mão
meus olhos, seu sorriso
seus olhos, meu caleidoscópio

tiro os óculos pra te ver melhor
clichê?, mas é verdade

e as violetas que você me deu, as pintei na memória e, como um retrato, olho pra elas e vejo você em todos os lilases do seu sorriso de Menino

Quero te comer com pão.

quarta-feira, setembro 07, 2005

what a difference a day makes...

Você vale a pena
vale o risco
você, Eldorado
você, Menino
seus olhos cor de acredite-em-mim,
acredite-em-nós
acredito-em-você...
seus olhos cor de âmbar cristalino
furta-cor
caleidoscópio
amor-perfeito?
seus pequenos e amendoados olhos cor de Vida
suas pequenas e macias mãos que procuram no meu medo a parte de mim que não se quebrou,
a erva frágil impondo sua presença à escapa rochosa e inóspita
com essas mãos lindas de Menino Lindo você me diz “deixa essas pedras de lado, vamos dar a volta no morro de mãos dadas e descobrir o outro lado”
eu me deixo guiar
porque os caminhos que conheço não servem
porque os caminhos que percorri me deixaram perdida e amedrontada
você, tão Menino!, me põe no colo e me beija e é ali que eu me sinto bem
e é ali que eu deveria mesmo estar
você me nina
e talvez haja um sentido em tudo
e, se não houver, o que importa é estar de mãos dadas contigo percorrendo nosso caminho

Eu quero acreditar!
Eu quero acreditar!
não quero mais a certeza dura e fria de um Destino que me elegeu pra ser só...
quero a flor, o céu, a amplidão deste Planalto
quero o salto
quero me arriscar
porque você é leve, é pluma,
é doce,
é você mesmo, sem reservas, sem máscaras

E porque é bom descobrir você um pouquinho mais a cada hora
e porque você fala das coisas que são suas
e porque você me tocou com mais esperança que medo,
eu quero acreditar na possibilidade de nós
quero acreditar que há Beleza no Mundo, na Vida
quero essa sua pele copo-de-leite
seu sorriso de lua nova
seuss olhos de outono
a voz da Fé que brota do seu coração de Menino que correu mundos
quero a sua vontade de homem
quero o seu querer em mim.

Eu quero acreditar, Luis.

segunda-feira, setembro 05, 2005

your timing sucks

Pois é, meus senhores, estava já bem tranquilamente vestida no meu querido pijaminha de aranhazinhas, quando tive que me levantar porque meus ouvidos ouviram e meus olhos viram coisas que me irritaram de tal maneira que me vi obrigada a escrever sob pena de não conseguir mesmo dormir com tanta coisa na cabeça, então lá vai mais uma teoria: acredito piamente que quando um cara está interessado numa mina, ele liga no dia seguinte. Ah, liga sim! Se ele for um cara bacana, ele liga. Agora, se decorrerem mais de vinte horas a contar a partir do último momento em que se viram e ele não se manifestar, esquece, minha filha, porque esse daí é só mais um embromador - chave de cadeia - porque quando a gente quer, tira tempo dos quintos dos infernos, dá um jeito de qualquer jeito e se comunica.
Eu, meus senhores, tenho esse ensinamento muito bem registrado na minha cabeça e, pra mim, esse é o grande teste: O Teste do Day After: ligou, interessou, não ligou, deixa pra lá.
E, tendo dito isso, não me demoro porque meu sono é mais importante. Boa noite, meus senhores.

espera

pois é, aqui estou eu, diante do mesmo de sempre: a espera. odeio esperar. a espera cria em mim uma angústia que vai me consumindo como a chama consome a cera de uma vela. eu preencho a espera com minha imaginação delirante. sim, ele tem razão, vivo num furacão de sentimentos. não consigo ser diferente. e não é por duvidar dos sentimentos alheios que a angústia me rumina, é por duvidar dos meus...
quando espero, crio outros mundos, outras possibilidades, outras desgraças, outras ruínas, outras idiotices. odeio esperar. deveria estar chovendo agora.

domingo, setembro 04, 2005

algoz


Talvez eu seja uma das pessoas que não se levantará amanhã. Talvez eu seja uma das pessoas que será ceifada ainda mergulhada no sono.
E se eu me levantar, talvez eu seja uma das pessoas que não verá o pôr-do-sol. Milhões de pessoas no mundo inteiro morrerão antes do pôr-do-sol de amanhã.
Por que não eu?
Um dia eu também serei um número engrossando as estatísticas. O que me garante que amanhã não será o meu dia?
E me entristece às lagrimas, não o que eu deixarei de viver, mas o que já não vivi... tudo o que eu queria ter dito e não disse. O que eu queria ter feito, e não fiz. O gesto que eu poderia ter feito, mas por medo, vergonha ou timidez, contive. O que passou, no passado está, nunca mais voltará.
A Morte, a Consoladora Final, a Libertadora, quando vier vai me levar banhada em lágrimas, estejam certos, meu senhores, porque eu deixei muita coisa virar pó sob meus pés, virar cinza, virar nada.
E, se houver um Juiz, ele não perdoará isso: ter deixado de viver por medo, vergonha ou timidez. Porque esse é um crime hediondo contra a vida, inafiançável.
E se minha alma for posta na balança, pesará mais que a pluma, porque sou culpada de não ter vivido o que podia.
E se o amanhã não chegar pra mim, levo comigo tudo o que poderia ter sido e não foi. Somente isto levarei comigo: meu pecado capital: não ter vivido o quanto pude.
De nada adiantam as lágrimas agora, de nada valem lágrimas diante do inevitável. E se choro, é por mim, que embora viva, não vivo.

Há coisa mais triste do que meramente sobreviver?


*esta é O Algoz, mais uma da série Murderous Desire.

here's where the story ends

Enquanto eu falava, olhava o veludo verde das folhinhas do jardim do DCE. Eu pude ver o movimento da sombra em nossa direção a medida que o tempo passava. É bom poder prestar atenção a essas coisas e prestar atenção no que é dito.
Senti formigamentos no lábio inferior, daqueles que antecedem as câimbras. Fui ao banheiro: perto da argola, estava inchado. Mais um incômodo. Eu precisava ir embora. Talvez eu quisesse ir embora, talvez eu não quisesse ir e isso me incomodava mais que o inchaço no lábio. Fui embora.
Entre outras coisas ele me disse que eu sou engraçada e que não sou tão solitária quanto pareço. É preciso reservar algumas coisas só pra gente, pois não? Muita gente me acha engraçada e acho que isso é bom, é bom pra mim ser engraçada. Muita gente já me disse que eu não deveria me vestir assim, dessa forma agressiva porque eu sou muito querida, muito fofinha na verdade. Sim, eu gosto de ser fofinha e ser querida, mas só com as pessoas que quebraram a primeira barreira que ergui, a da aparência.
Enquanto eu falava, me sentia como uma cebola que perde as camadas. Nada de borboleta saindo do casulo, não, nada de borboleta: prefiro a cebola que perde as camadas porque o miolo, aquela parte mais interna quer sair, quer respirar, e tudo o mais prende, sufoca. E meu lábio formigava e inchava. E eu precisava ir embora. Na minha cabeça, marquei de almoçar com um amigo, como nos sábados anteriores. Sabia que talvez chegasse lá e ele já estivesse almoçando, mas eu não quis ligar. Pra dizer a verdade, não tive vontade de falar com mais ninguém. Pra dizer a verdade, ouvia um monte de vozes tumultuando as idéias frouxas que eu deixava escapar sem pensar nelas, porque se tivesse pensado no que dizia, talvez não tivesse dito nada. Um dos meus problemas é precisamente este: se eu pensar no que preciso dizer, fudeu, não falo nada. A espontaneidade, tanto pra falar quanto pra escrever, pra mim é fundamental.
Eu sei que ele leva muito tempo pra escrever e isso me deixa sem a menor paciência. Ainda não aprendi a não usar este meu parâmetro específico nos outros. Estranho isso, não? Ao mesmo tempo, eu sei respeitar muito o tempo das outras pessoas, entendo que cada um tem um tempo que não pode ser nunca comparado ao dos outros, mas nesse aspecto tão fundamental que é o da língua, tanto a falada quanto a escrita, neste aspecto eu não sei respeitar nada: eu quero tudo agora, pra já. E me incomoda ter que esperar por isso. me sinto como se participasse de um folhetim, esperando sempre muitos dias antes que a próxima parte, o próximo capítulo chegue. Isso me irrita sobremaneira. Talvez as cartas sejam bem melhores porque nelas o tempo, nem que seja o do correio, deve ser respeitado a despeito do que eu quero.

Quando cheguei ontem, meio sonolenta, meio bêbada, totalmente cansada, não conseguia parar de repetir mentalmente “20th century boy I wanna be your toy”[i] que eu havia ouvido na festa, e até pensei em escrever muitas coisas, mas felizmente eu dormi antes.
Acordei e fui conferir se meu lábio desinchou. Desinchou. Noites de sono pesado fazem muita diferença...
Acordei e lembrei de Temptation[ii]. Essa música tocou ontem na festa também e aí eu me lembrei dele. Por causa dos olhos dele. Esses benditos olhos dele. Um dia ele começou isso tudo dizendo que me observava. Que coisa!, detesto como as pessoas chegam assim e vão logo bagunçando aquilo que a gente tenta arrumar e arrumar e arrumar. Como o condenado grego que rola a enorme pedra morro acima e ela rola morro abaixo e assim ele continua durante a eternidade. Tem sempre que ter alguém pra bagunçar o coreto, pois não? Só se a gente deixar. Lembrei de um filme de vampiros que eu adorava na adolescência “garotos perdidos”, porque tem um momento em que alguém diz que o problema é você convidar o vampiro pra sua casa, aí fudeu. Pois é, acho que eu mesma abri a porta e disse “sinta-se a vontade”. Mas não, eu não quero mais ninguém aqui dentro não. As vozes que me tumultuam os pensamentos são os ecos de todas as pessoas que eu deixei entrar, feedbacks dos momentos de agudíssima tristeza, de desespero, de tudo o que ruiu, de tudo que era cristalino e diáfano e aí, num belo dia, implodiu. Houve coisas boas também, muito boas, mas as ruins sempre dão um jeitinho de se sobrepor, pois não?
Eu sempre falo demais e nunca sei mesmo quando parar...
Mas agora eu estava indo tão bem, tentando me organizar, tentando tão desesperadamente me organizar! Não, eu não quero mais brincar disso não. Chega de construir pra depois ver tudo cair. Eu não quero ser condenada a rolar a pedra morro acima e depois ser esmagada por ela morro abaixo. Prefiro já ficar logo espatifada ali embaixo e não me erguer nunca mais. Chega. Chega mesmo. É, eu sou pessimista? Pessimista é o caralho, eu sou é realista! Tudo sempre acaba e da pior maneira possível porque eu tô sempre levando alguma porrada da porra do sobrenatural. Ah, eu sei lá. Sei lá! Dá licença d’eu não saber nada?! Eu não sei mesmo. Porque eu sou assim, fico imóvel diante do medo. Pessoas me dão medo, embora eu sorria gentilmente pra elas. Embora eu faça gestos. Embora eu não vá embora. Pessoas são um perigo iminente!!! Por isso prefiro os livros. Por isso eu amo os dicionários: está lá, tudo está lá e continuará lá. Você abre, procura em ordem alfabética e pronto. Mas as pessoas, as pessoas são o meu flagelo. Por isso o bom-humor e por isso a Solidão. As duas coisas andando de mão dadas comigo. Uma vez eu escrevi que a Loucura havia começado a brincar comigo também porque a Melancolia a havia convidado a se juntar a nós. Mas Ela recuou um pouco, talvez tenha se entediado comigo. Já que a Melancolia é coisa que não se afasta nem com muita reza de benzedeira forte, pelo menos a Outra recuando já me dá um certo espaço, já me deixa respirar um pouco mais porque suas brincadeiras são daquelas que machucam e eu sempre terminava chorando.

E mesmo que eu escute músicas que parecem ter sido feitas pra mim, pra mim neste exato e preciso momento, como Hideous Town[iii] e My Finest Hour[iv], isso é tudo mais uma brincadeira cruel Dela. Nada disso está de fato acontecendo pra fora de mim. E ainda que eu vá a mil festas e escute 20th Century Boy e Temptation mil vezes, nada disso está acontecendo pra fora de mim. Melhor ficar com os dicionários, inofensivos dicionários, do que com as pessoas, essas vilãs eternas da minha vida. Sartre é que estava com a razão: o inferno são os outros. São mesmo.
Chega a ser pateticamente engraçado isso, essas imagens que faço de mim mesma cercada por livros e potes de sorvete e barras de chocolate. Antes eles que os gatos. Gatos são bonitos e preguiçosos, mas eu realmente acho nojento isso deles subirem em tudo e espalharem pêlo. Mas admiro a atitude deles de não se apegarem às pessoas e sim às casas. Gatos são criaturas espertas. Um dia eu aprendo isso também.
Agora é o momento de negação, de negar tudo tudo tudo. Agora é o momento em que se eu não corro, o bicho come. Não, se eu fico o bicho não pega porque ele não me vê. Eu fico aqui bem escondidinha e ele vai passar correndo por mim sem me ver. E é isso o que farei, me trancarei em mim porque nada mais faz sentido mesmo. Chega de ter expectativas. Chega de esperar. Tá vendo como os dicionários são ótimos e lindos?! Escrevo espectativas com s e o editor de texto do Word sublinha em vermelho, então eu abro o dicionário e confiro que a palavra certa é com x, então vou corrigir na hora o que, de outra forma, eu não corrigiria nunca. Mas é claro que não confio no editor de texto do Word! Ele vive sublinhando em vermelho palavras que estão mais do que corretamente escritas. O problema dele é que ele não conhece muitas palavras e é por isso que eu gosto mesmo é do Houaiss. Aí, tá vendo, lá vem ele sublinhando o Houaiss. Deixa ele sublinhar o tanto quiser.

Antes eu corria, sabe? Corria mesmo, literalmente. Depois passei pra fase do confronto direto, do embate corpo a corpo. Ia lá e falava tudo o que eu queria assim, na cara mesmo, olhando no olho. Agora? Agora eu fico quieta porque nada nunca deu certo, entre tudo o que tentei, entre todas as possibilidades que tentei, nada deu certo, então a minha tática agora é essa: eu não faço mais nada. Quer dizer, ainda escrevo, mas escrever é uma necessidade maior que eu. Ainda que eu não escreva pra postar neste blog, escreverei no meu diário de folhas escuras de papel reciclado e sem cloro. Gosto das folhas assim, mais cruas. Acho que fica até mais bonito vomitar ali a crueza da minha vidinha boba e sem poesia. As folhas escuras, cor de terra, cor de matéria orgânica, cor das minhas entranhas. Combina.
Mas a mão com a caneta não é tão ágil quanto os dedos nas teclas.
Mas as palavras aqui, escritas com essa letra de computador, não parecem minha por mais que eu mesma as tenha digitado. E, quando desligo o computador, tudo se acaba.
O papel é melhor.
Preciso parar de digitar e fazer minha faxina. Decidi fazer uma faxina. Pelo menos as coisas do lado de fora ficarão mais organizadas. As de dentro, bem, me entendo com elas depois. Ou talvez nunca, mas agora não é hora de se pensar nessas coisas porque senão Ela volta e bagunça tudo de jeito que nem eu e nem nenhum especialista consegue consertar.
Here’s where the story ends[v].

...

sábado, setembro 03, 2005

trilha sonora

Hoje eu olhei nos olhos do Menino Dentro do Espelho. Ele tem olhos lindos de não sei que cor. Olhos que não me refletem. Olhos de menino que olha e vê. Vê. Não faço idéia do que viu, mas me olhava.
É sempre difícil olhar as pessoas nos olhos, falar com elas olhando nos olhos. Acho que por isso não gosto de conversar com as pessoas nos ônibus e/ou filas, mas gosto de conversar pela internet...
Fiquei com vontade de apertar as bochechas dele, o Menino das mãos pequenas como as de um menino. O Menino dos olhos expressivos cor de tanta coisa.
Meus olhos são castanhos.
Às vezes me sinto como uma pintura do Magritte: c’est n’est pas Verônica.
Gostei muito de ter conversado com o Menino, apesar dos olhos nos olhos que me deixa nervosa. Eu precisava de uma conversa assim, de horas. Precisava ouvir e falar sobre coisas bobas e sobre coisas pessoais, leves, bonitas, tristes, doloridas. É sempre bom ouvir um pouco da vida das pessoas. Não sei que tipo de mecanismos nos movem às vezes, mas é bom que sempre haja algo de inexplicável nos bastidores da vida, do mundo.

Menininho, quem vive a vida com o coração está sempre tão mais vulnerável.


Nessa manhã eu falei muito, na outra, pouco, mas é como eu te disse, sou péssima com medidas, com quantidade. Quanto mais eu persigo o bom senso e o meio termo, mais sou pêndulo oscilando entre o excesso e a carência...
Sabe, fiquei pensando no que você disse sobre eu não parecer tão solitária... O problema da Solidão é que ela nos acompanha sempre. E eu costumo preferir ficar a sós com ela de uma vez. É como eu disse, nada pior do que estar cercada de gente e sentir-se terrivelmente só. Às vezes isso é mais intenso, às vezes mais sutil. Mas a Solidão anda comigo aonde quer que eu vá. Nem sempre isso é um problema porque há momentos em que a minha solidão dialoga com a solidão dos outros. Talvez isso seja como na sua Teoria da Bolha. Mas há alguns momentos, faíscas, um centésimo de segundo, em que você abraça alguém e aí não está mais só. Eu sinto isso às vezes. É raro, mas acontece. Algumas pessoas têm presenças tão intensas que a minha solidão é ofuscada. É uma sensação estranha que simplesmente me toma de assalto, me surpreende. Não dá pra pôr em palavras.
Frase que o Menino já conhece: “melhor deixar isso de lado, melhor não mexer com isso não”.
A carreira de loser me deixou estática. Nenhum passo em qualquer direção.
O que me inspira? O que me move? Quase nada. Antes eu sonhava com mundos diferentes desse, agora tenho pesadelos com meu trabalho... Antes eu acreditava em amores imortais, agora olho a vida de soslaio. E agora eu me sento e espero pacientemente que o Destino faça as escolhas por mim. Cansei de ter iniciativas e dar com a cara na parede. Chega uma hora em que a gente cansa, sabe? Por isso eu estou simplificando minha vida: agora eu confio no que pode ser comprado: sorvete, chocolate e entradas pra o cinema. Amor é necessário, mas quanto? Qual é o preço que se paga por ele, afinal de contas... Infelizmente não tenho mais limite e nem crédito e Amor é o tipo da coisa que nem meu seguro e nem meu convênio médico cobrem, assim como quaisquero outras lesões auto-infligidas. Aliás, Amor deveria entrar na cobertura de todo seguro e de qualquer plano de saúde.
Enfim... Obrigada pelas horas.
Ah, não sei se você, Menino, conhece e/ou gosta, mas eu estou ouvindo The Sundays. Tem também Cocteau Twins que é fofíssimo e Cranes. São bandas com meninas nos vocais. E as musiquinhas parecem uma trilha sonora de sonho. A música consegue ser tão forte...

*Egon Schiele - Girl and Death (self portrait with Walli) 1915

a Cassandra que em mim habita
olhando pra dentro, vê o mundo
olhando pra o mundo, vê o que escondo
as palavras
as palavras são perigosas
os sorrisos são uma tentativa
há quem sorria com os olhos
a Cassandra que me observa de dentro pra fora...

quinta-feira, setembro 01, 2005

primeiro de setembro

Pingo pingo pingo.
O sangue vermelho no chão.
O sangue vermelho na pele.
O sangue vermelho.
Meu nariz sangrou duas vezes hoje.
Na segunda vez o sangue espirrou pra longe.
Não gosto do gosto do sangue fazendo seu percurso garganta abaixo.
Não gosto do sangue.
Gosto do vermelho que sai diferente em cada parte do corpo.
O sangue do nariz é um vermelho intenso, mas ralo.
Não gosto de ver o meu sangue derramado.

...

Eu sei agora o que quero da vida: cafuné. Descobri enquanto era afagada desajeitadamente na kingdom hoje de tarde. Eu estava com tanto sono... E o menino afagou meu cabelo azul-esverdeado enquanto lia o final dos X-men em um universo qualquer que de nada me interessa. Então eu tive essa iluminação: é isso! é isso o que eu quero da vida: cafuné!!! Mas não exatamente aquele cafuné dado sem motivos, quase mecânico, não, não, meus senhores, eu quero um cafuné que seja só meu, feito exclusivamente pra mim, com o motivo singelo e preciso de fazer carinho não nos meus cabelos desgrenhados mas – preparem-se pois isto soará ultramegasuperhiper piegas – na minha alma, ou o que a valha, já que ainda não decidi se possuo ou não tal artefato ideológico. Enfim, eu quero alguém que me ponha no colo, e que por me amar, me faça cafuné sem cerimônias, sem embaraço, com todos os sentimentos do mundo, sem dizer nada. Eu já os avisei, meus senhores, que eu sempre quero muitas coisas.

...

Pois bem, meu senhores, acho que coisas acontecem no mundo pra dentro do espelho pois o menino de lá parece um tanto quanto incomodado comigo. Por quê? Oras, sei lá! Quem entende os homens?! Só sei que ele tem sido lacônico. Que se há de fazer?
Deve ser culpa minha. Eu nunca fui muito boa com semi-conhecidos. Firmar laços de amizade com o imaterial nunca foi meu forte, tirando minha amiguinha invisível da infância. Eu só sei lidar com o concreto, com o palpável. O resto é resto, incerto e entediante. E eu sou isso mesmo: constante na inconstância, tentando evitar a fadiga e o câncer de pele. Me preocupando com a possibilidade de um meteoro tirar a Terra de seu eixo, mas sem prestar muita atenção ao velho sujo deitado na rodoviária.

...

Eu não olho nos olhos de mendigos, e nem das pessoas que se sentam ao meu lado nos ônibus. Preferiria que elas simplesmente não estivessem ali. Mentir pra quê? Eu não gosto de mendigos. Também não gosto de hippies. Preferiria que algo acontecesse pra que eles deixassem de ser moradores de rua. Não, nada de extermínio, tenho horror a violência!, eu só gostaria que essas pessoas pudessem ter oportunidades pra mudar e sair dessa vida da rua, da sujeira, das esmolas. Odeio esmolas. Não dou esmolas.
Sim, gostaria que essas pessoas tivessem acesso a muitas coisas, mas nunca a mim, não gosto de desconhecidos. Não quero falar com desconhecidos. Já me bastam os amigos de amigos. Acho que as pessoas devem ter uma razão pra falar umas com as outras, e não apenas a necessidade de falar e falar e falar. Tem gente que não consegue fazer uma porra de viagem de ônibus calado. Pegar fila de banco então...
Eu prefiro o silêncio e o anonimato.
Mas acho bacana conhecer pessoas pela internet. Já conheci pessoas bem legais pela internet. Porque a internet mantém a distância segura, elimina o olho no olho e eu gosto disso. Depois sim, tudo bem, quando já se conversou bastante, aí é legal se conhecer pessoalmente. Eu gostaria de ter mais amig@s “virtuais”. Mas acho que não sou muito boa nisso também. Tanto pior quando a mão de fingidora-poeta/poeta-fingidora me pesa e eu acabo escrevendo coisas que nem eu sei o que querem dizer, mas isso não me incomoda porque gosto de não entender algumas coisas que podem muito bem ser apenas sentidas. Somos sempre tão positivistas, não? E eu prossigo inconstante...